domingo, 10 de outubro de 2004

Até que a morte nos separe.

Conta a lenda que, durante a II Guerra Mundial, Londres deu festas homéricas. Alvo principal dos bombardeiros alemães, a cidade, mesmo sob a blitz nazista, não intimidou-se: por detrás das cortinas pesadas, estava literalmente "bombando". Permanecer na cidade - e, ainda por cima, fazer festa - era, para os londrinos, uma forma de resistência.

Reparem, porém, no detalhe "por detrás das cortinas pesadas."

Senão pela imposição oficial do blackout - que dificultava a localização dos alvos por parte dos alemães - , o salutar instinto de sobrevivência avisava que era melhor cobrir as janelas. E uma festança no meio da rua não deve mesmo ter passado pela cabeça de ninguém.

Então eu me pergunto: como é que, em um Iraque ocupado, as pessoas fazem festas de casamento onde o ponto máximo é sair às ruas e dar tiros para o alto ?

Os resultados desastrosos deste costume estão aí para quem quiser ver: desde março de 2003, pelo menos cinco festas de casamento foram atingidas por helicópteros norte-americanos. Informações desencontradas - que dão conta, inclusive, da possível presença de forças rebeldes nestes eventos -, parecem indicar que, na maior parte das vezes, o "tiroteio festivo" é o causador da desgraça. Diante de uma saraivada de tiros, os americanos acabam abrindo fogo.

Mas é impossível não se perguntar porque os iraquianos continuam festejando casamentos dessa maneira? Será que ainda não se deram conta de que é perigoso? Ou será que se deram conta e estão se lixando? Notem que, seja qual for a resposta, ela acaba por encaminhar uma segunda pergunta: Mas o que há de errado com os iraquianos para que eles "não se dêem conta" ou "não se importem"?

Talvez não haja nada de errado com eles.

Talvez, eles já não comemorem casamentos assim há muito tempo. Talvez, os alvos atingidos sejam mesmo redutos rebeldes a partir dos quais se alveja os helicópteros americanos. Talvez, as crianças e mulheres sejam os filhos e esposas de rebeldes - e a TV sempre nos mostra como as crianças, ao contrário de serem poupadas do horror, são colocadas, de armas em punho, à frente das passeatas e demais demonstrações do radicalismo islâmico.

Talvez, amigos, a história do "casamento bombardeado" não passe de uma retórica. Algo destinado a escancarar a "selvageria" dos solados americanos.

Não que os soldados americanos sejam anjos - ninguém que esteja em guerra pode sê-lo.

Mas aceitar tantos "casamentos bombardeados" é aceitar que os iraquianos são criaturas absolutamente limitadas, sem a menor capacidade de adaptação ou instinto de preservação - o que significa aceitar que eles são menos que macacos.

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