quinta-feira, 3 de novembro de 2005

O povo não será grampeado.

Parlamentares não deveriam proferir ameaças de agressão física a um presidente. Mas parlamentares também não deveriam ser grampeados. Ocorre que entre os políticos que queremos e aqueles que temos, vai uma grande distância. É a mesma que separa o país que sonhamos daquele onde vivemos.

O brasileiro - este que, todos os dias, dirige impropérios a parlamentares e presidentes na intimidade de seu lar - é, até agora, um mero espectador desta crise. Às vezes, ao encontrar um parlamentar, o povo manifesta sua indignação de forma individualizada. Pelo menos é isso que nos contam os próprios deputados e senadores, sempre que mencionam os e-mails recebidos, as experiências de visitas às bases e os protestos emitidos, com discrição, nos aeroportos.

Para além das tentativas fracassadas de promover manifestações artificiais, não houve, desde o início desta crise, qualquer protesto genuinamente popular. Na verdade, se nos perguntarmos quantas vezes algo assim aconteceu na história do país, ficaremos surpresos com a baixa incidência de participação popular na vida política nacional.

Aí o leitor vai me dizer: "Mas nós estamos falando. Eles é que não ouvem!".

Não ouvem porque não sabemos fazer mais do que resmungar pelos cantos. Trocamos e-mails e escrevemos em blogs. Reclamamos com o padeiro e com a secretária. Nos indignamos na mesa do bar e em torno da cafeteira. Somos sumidades em política depois do jantar, discursando lindamente - para o desespero dos garçons que querem ir para casa. Mas não sabemos nos fazer ouvir.

Dirão alguns que sempre há a voz das urnas.

Verdade.

Ocorre que, quando chegamos às urnas, só nos resta optar.

É preciso se fazer ouvir antes das urnas, no momento exato em que as opções estão sendo definidas. É preciso mostrar uma indignação que não deixe dúvidas sobre o que pensamos. E eu não estou defendendo violência, desordem ou revolução. Estou apenas sugerindo que o brasileiro pare de cochichar e assuma o seu lado Arthur Virgílio: que levante a voz, erga o dedo em riste e ameace com tabefes sempre que o assunto for política.

O estilo não é bonito, eu sei. Mas se funciona lá em Brasília, deve funcionar aqui também. No mínimo para provocar algum ruído - algo que consiga fazer com que os microfones girem na nossa direção, mostrando que nós, a exemplo do senador, estamos dispostos a perder a linha.

Falar à meia-voz, sem teatralidade, como temos feito até agora, não vai adiantar.

Ninguém quer nos ouvir. Ninguém vai nos grampear.

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