segunda-feira, 27 de março de 2006

Nem a imprensa.

Não sou fã de Diogo Mainardi. Gosto de algumas coisas que ele escreve e dou boas risadas lendo sua coluna. Mas aquele jeito de pivete de rua, gratuitamente malcriado, sempre chamando a tudo e a todos para a briga, é a irritante invenção de uma persona. Só isso. Nada mais do que isso.

O pivete, porém, tem o dom de, vez por outra, trazer à tona questões incômodas, que muitos prefeririam jogar para baixo do tapete. Foi o que ele fez neste final de semana.

Muito bem...Podem me chamar de inocente. Porque, enquanto tudo parecia ruir, enquanto ética e qualquer resquício dela saíam pelo esgoto, eu ainda acreditava que tínhamos uma carta na manga. Acreditava que a Imprensa - esta mesmo, que se escreve com "i" maiúsculo por não aceitar coleiras partidárias - cumpriria seu papel.

Tudo apontava para isto. Ou, pelo menos, parecia apontar já que, nos últimos dez meses, a imprensa foi pródiga em investigar, até a medula, todo e qualquer indício de corrupção.

Ocorre que não é bem assim. Não, não é.


Basta ler a última coluna de Diogo Mainardi para a Veja, que nos descobrimos diante de uma imprensa disposta a investigar tudo, sim - desde que este "tudo" não fira seus princípios corporativistas.

Diz Mainardi que, desde a semana passada, toda a imprensa sabia que os extratos bancários de Francenildo foram entregues para a Revista Época pelas mão de Marcelo Netto - assessor de imprensa de Palocci e pai de um jornalista que trabalha naquela revista.

Se isto for verdade, concluiremos que a imprensa passou uma semana inteira esperando pela Polícia Federal quando poderia ter agido como sempre agiu: poderia ter investigado por conta própria, a partir da ponta do novelo que, desta vez, era personificada por um colega de profissão. E, se preferiu não fazê-lo é porque optou, neste episódio do caseiro, por agir de forma tão condenável quanto o atual governo: trabalhando, em primeiríssimo lugar, apenas preservar os seus pares.

Se isto for verdade, significa que não nos restou nem a imprensa. Significa, em última análise, que podemos contar apenas com Diogo Mainardi. O que implica admitir: estamos fritos.

6 comentários:

sergio disse...

Em qualquer circunstancia e preciso que alguns (ou alguem) resista e revele. Realmente, nem a imprensa escapou. Desta vez so mesmo o Diogo teve coragem de dizer a verdade, que muitos sabiam e preferiram calar.

Jorge Nobre disse...

Já eu gosto muito do Mainardi - mais que do Olavo de Carvalho.

Thomaz Magalhães disse...

Interessante a abordagem, sem o costumeiro ranço acompanhante das críticas ao Mainardi. O tema se atém mesmo ao comportamento da imprensa. Foi corporativa, sim, e tem mais uma: acobertou eventual envolvimento de Marcello Nettto e seu filho repórter da Época e, pior, não lhes defendeu também do ataque de Mainardi. Não me lembro de Mainardi tão perto da linha que define crime de calúnia. O cara jogou pesado dessa vez. Será que não perceberam isso? A troco a imprensa não deu um pio sobre as graves acusações de Mainardi contra o colega Marcelo Netto e seu filho? Não bulir no vespeiro? Aí tem.

Ruy disse...

Nariz, eu nem sei como posso responder a isso sem ser acusado de corporativismo, mas paciência. Sem nenhuma intenção de defender os maus "coleguinhas", digo duas coisas: 1) vá com calma; 2) Mainardi exagerou, no mínimo.

O nome do Marcelo Netto está nos principais jornais desde que o escândalo da quebra ilegal do sigilo do caseiro eclodiu. A imprensa, de fato, sabe que ele é o principal suspeito de ter vazado as informações para a "Época" -e não escondeu isso. (Tanto que o Netto está ameaçado de cair junto com o Paloffi.) Não tenho tempo de fazê-lo agora, mas posso citar todas as reportagens da Folha, p. ex., em que ele é mencionado da quinta-feira retrasada para cá. Ou o Mainardi não leu nada disso ou quer reforçar sua imagem de "lutador-solitário-contra-a-imprensa-petista-e-corporativista", mesmo à custa dos fatos.

Também não procede a história do "esperando uma semana inteira pela PF". Embora a PF seja bastante comprometida, a investigação é necessária -para repassar os dados à "Época", Marcelo Netto dependia de gente dentro da Caixa que quebrasse o sigilo do caseiro. É isso que, em tese, devia ser investigado. Foi mesmo o Jorge Mattoso, por ordem do Paloffi ou do chefe da gangue? (Pela PF não se chegará ao chefe da gangue, eu sei.) Tanto a imprensa como os leitores queremos saber. :) Um beijo.

(N.G.: Graças aos céus, não estamos sós.:-) Assim que sobrar um tempinho, irei atrás dos links das matérias, Ruy. Eu sei que você não é corporativista. Um beijo.)

Aluizio Amorim disse...

Nariz,

como jornalista há pelo menos 35 anos e todo mundo sabe disso.Li o Mainardi mas não vi nada de especial. Evidentemente, não sou corporativista e inclusive sou contra a regulamentação profissional e favor de uma instância regulatória fora do Estado, com é a OAB. Mas isto é outro papo. O fundamental de tudo é que prevaleça a liberdade de imprensa, que é o que o PT detesta. A a liberdade de imprensa, como a democracia, é sempre uma faca de dois gumes. Mas não se encontrou ainda forma melhor de organização da sociedade. Eu vejo no episódio esse Marcelo Neto como arraia miúda. Pau mandado. O que está muito claro para todos é que o mandante do crime é o poder que, neste caso, está personificado pela Presidência da República. O rei está nu. Só no Brasil que não acontece o que aconteceria em qualquer País decente: o impeachment.

Abs
Aluízio Amorim
http://oquepensaaluizio.zip.net

P.S.: Há muito tempo escrevi um artido para o Observatório da Imprensa (deve estar lá nos arquivos ou basta ir ao Google), que a bordo a questão do atividade do lobby dentro da imprensa e da mídia em geral.

Angelo da CIA disse...

Antes de mais nada, Mainardi não é jornalista. Ele nunca se disse jornalista. Porém, este é o primeiro argumento dos jornalistas para desmoralizá-lo: "Ah, ele nem é jornalista!"

Bom, justamente por isso ele se sente à vontade para delatá-los. Por isso também ele tá cagando e andando para a "ética" jornalista, muitas vezes amoral ( lembram do caso Janene? ).

O fato é que Mainardi traz à tona discussões sobre a imprensa que nem todas as edições do "Observatório da Imprensa" juntos conseguiram. Mainardi, em certo texto, afirmou que éramos nós contra eles, os petistas. Tem sido assim nas redações. Tereza Cruvinel tá rompida com Jorge Bastos Moreno. Alon Feuerwelker era amigo de Rui Nogueira da Primeira Leitura, e agora trocam rusgas. Boris Casoy e Paulo Henrique Amorim se odeiam mutuamente. Assim seja. Que os jornalistas acabem, de uma vez por todas, com suas dissimulações de isenção. Assumam de uma vez de que lado estão, seja o lado que for

(N.G.: Oi, Angelo. Gosto do Mainardi em algumas coisas - outras nem tanto. Mas a questão que se discute aqui é que ele afirmou, erronemamente, que ninguém na imprensa citara o Netto - e eu embarquei sem verificar a informação. Só isso.)