Ontem, em editorial intitulado "Reino animal", a Folha de S. Paulo refletiu a respeito do adesismo que tem caracterizado a oposição nos últimos meses. No início da semana, o Estadão havia publicado editorial semelhante: das trocas de carinho entre Antônio Carlos Magalhães e Lula, passando pela mutação de Mangabeira Unger em ministro, pelo beija-mão protagonizado por Tasso Jereissati e pela descarada corte que Aécio e Serra fazem a Lula, todos os passos são reveladores de uma oposição moribunda, em nada merecedora dos votos que recebeu na última eleição.
Há reações, é claro. De Fernando Henrique, que nenhum cargo eletivo ou partidário ocupa. De Jorge Bornhausen, que também não ocupa mais qualquer cargo formal. São manifestações que soam teatrais diante da franca capitulação de uma maioria que possui mandatos. É como se ambos tivessem sido encarregados de amenizar as coisas, com discursos e entrevistas, para aqueles 40 milhões de eleitores. Se estão conscientes de que tal papel lhes foi atribuído, não sei. Mas sei que são políticos experientes demais para se pensar que não.
No frigir dos ovos, o que se tem é um quadro de inspiração petista: enquanto achincalha a elite, Lula é o presidente preferido dos banqueiros. Enquanto Bornhausen e Fernando Henrique fazem duras críticas ao governo, os luminares de seus respectivos partidos negociam, dialogam e aderem.
Clara como a água do mais puro córrego, ou fétida como aquela do mais podre esgoto, a situação se impõe mesmo para os que gostariam de ignorá-la: já faz alguns meses que Lula, o PT e os demais partidos da base governista são um problema secundário. É óbvio que, uma vez reeleitos, eles estejam tratando de colocar em prática seus planos - pouco importando que boa parcela do eleitorado seja contrária a eles. É da democracia que assim seja. O que não é da democracia é que tais planos não encontrem resistência. O que não é da democracia é a ausência de uma oposição - ou a existência de uma oposição meramente cênica, só existente diante dos holofotes da imprensa, que não hesita em amasiar-se com o Executivo em plena luz do sol.
É com pouca munição, pois, que chegamos ao Level Two do jogo democrático. Temos quatro longos anos para chegar com vida ao Level Three. E, embora o objetivo maior seja o mesmo, há novas armas e novos inimigos. Há, antes de mais nada, um exército mercenário do qual precisamos nos livrar. Bem sei que será difícil sem eles. Com eles, porém, será impossível. Por eles, o jogo acaba aqui.