domingo, 6 de julho de 2008

Vacas de presépio

Segundo pesquisa do Datafolha divulgada hoje, 86% dos moradores de São Paulo e do Rio de Janeiro aprovam a lei seca. E eu fico impressionada com a vocação do brasileiro para implorar que o Estado lhe conduza no garrote porque ele, o brasileiro, não é capaz de cuidar de si mesmo.

Na minha opinião - pessoal e intransferível, sempre é bom lembrar - a pesquisa do Datafolha revela que 86% dos moradores de São Paulo e do Rio são uns bananas. Para evitar os males causados por uma minoria irresponsável, eles topam abrir mão dos seus direitos.

Aposto que nenhum destes bananas fez qualquer coisa para garantir que a lei anterior fosse respeitada. Nenhum deles exigiu, antes, que quem fosse pego com mais de 6 decigramas de álcool no sangue recebesse punição tão dura quanto perder a carta por um ano ou, em casos mais graves, ser preso. Agora eles estão achando lindo ter uma vida pautada por bêbados irresponsáveis. Estão adorando que todos sejam tratados como alcóolatras. Isso sem falar na anuência dos idiotas que, como eu, não bebem mais do que um cassis no mamão e que, agora, se dispõem a dar carona para a cambada que entorna.

Pois saibam que, de minha parte, já estão todos avisados: quem beber que pague um taxi. Era só o que faltava eu, além de ficar sem o meu bombom de licor por conta desta turma, ainda ter que virar motorista nas horas vagas. De mais a mais, se ainda não deu para notar, estou com o meu saco bem cheio de gente sem noção de cidadania, democracia e direitos individuais. Estou de saco bem cheio de gente que está sempre disposta a ajoelhar para o Estado; a pedir que o Estado lhe imponha limites tão desmedidos quanto a sua falta de controle.

Primeiro foi o cigarro. Depois, aquela tentativa - medianamente frustrada - das armas. Agora é o álcool. E somente o álcool porque, notem bem, o cara pode percorrer toda a Via Dutra travado de cocaína ou chapado de maconha sem que a polícia o importune - e se importunar, ele, como "usuário", receberá uma pena bem mais leve do que se tivesse consumido um criminoso prato de sagu.

Diante de tal realidade, resta aguardar pelo momento em que, sob a alegação de que os males da obesidade custam caro ao Estado, seremos obrigados a abrir mão de uma picanha gorda. E o sujeito um pouco acima do peso ideal, então, será repreendido pelos garçons no almoço de domingo - sob os aplausos deste rebanho de vacas de presépio.

35 comentários:

Eduardo F Netto disse...

Sentar em um bar e conversar com os amigos, a família, a namorada é o que nos resta de diversão, aqui em São Paulo, iremos aonde?
Ficar a noite toda tomando Coca Cola não da.
A Melhor coisa é ficar jogando conversa fora, tomando um Choop é ficar observando o lindo brilho dos olhos de nossa linda amada.

João Berg disse...

Que beleza de Estado Policial! É gozado como a democracia ou ditadura são regimes que emergem de baixo pra cima, ao contrário do que todo mundo pensa. O ditador é simplesmente a propriedade emergente do que as pessoas pensam, ou deixam de pensar.

DORA JARDIM disse...

O pior é que se vai levando a vida como se fosse natural a intrusão do Estado em nossas particularidades, nossa individualidade, nosso ir e vir e os BANANAS NÃO PERCEBEM! Quando do plesbicito sobre desarmamento votei contra e votaria novamente.Se tenho o direito de defender o que é meu, legalmente, porque vou entregar ao Estado minha liberdade de escolha?

marcia1907 disse...

valeu ng,
valeu.
o brasileiro não tem noção de cidadania e nem percebe o precedente que está abrindo.

Ruy disse...

Acho que o resultado seria igual em qualquer região do Brasil. Triste. Mas o que eu acho é que, além das vacas-de-presépio, há aqueles que acham que a lei é "só para os outros", por incrível que pareça. Na semana passada, a Folha entrevistou algumas figuras assim, tipo um sessentão que acha "ótima" a lei mais rígida, toma até dez doses de uísque por noite e não pretende parar ("nunca sofri acidente" etc.).

Outra coisa: você viu as restrições do TSE a "campanha" (aspas novamente necessárias) na internet? Achei gravíssimo. É o tipo de coisa que talvez inspire um post seu.

Beijos com saudade, querida.

(N.G.: vi, sim, Ruy. Preciso mesmo escrever sobre isso. Beijos)

Cristal disse...

Socorro !!!

Com tanto lugar no mundo eu tinha que nascer logo nestepaiz de povo sem noção.

MARCO ANTONIO disse...

A continuar assim, mesmo o pedestre terá que se submeter futuramete ao teste do bafômetro. Como pedestre não tem carteira e nem carros para serem apreendidos, deverá entregar alguma outra coisa ao Estado, provalvemnte a carteira de identidade ou, quem sabe, a carteira de dinheiro.

Claudio disse...

O resultado dessa pesquisa não mer surpreende. Primiro porque, sim, o brasileiro apóia medidas draconianas nem tanto por ser estatólatra mas por ter aversão quase patológica ao individualismo (e tudo que ele envolve como, por exemplo, a responsabilidade). Segundo, o brasileiro gosta de posar de civilizado e se a Globo - incrível como ainda há gente, nesses tempos de Internet, cuja única fonte de informação é a chamada mídia mainstream - diz que leis rigorosas são características de países desenvolvidos, então o brasileiro vai apóia-las para passar por civilizado. Terceiro e último, que motiva o segundo: brasileiro acha que a lei é para os outros. Não conheço ninguém que não conte com algum conhecimento para fazê-lo escapar de uma multa ou punição qualquer.

Temos muito que evoluir no que diz respeito a Estado de Direito.

Max disse...

Ng, mais uma vez você foi perfeita. Eu sou daqueles que bebe guaraná zero na Happy Hour com os amigos, mas também gosto de uma taça de um vinho tinto ao jantar... Eu penso que democracia e liberdade são irmãs e que a mãe delas chama-se – responsabilidade. Infelizmente, nós brasileiros esquecemos o capítulo dos deveres que o cidadão tem que ter para viver em liberdade com democracia. A responsabilidade de beber e dirigir é mais um ponto básico para a cidadania. Foi pego pela fiscalização com taxa maior do que o permitido – cadeia. Eu sei bem o quê é isso pois já morei no Canadá e na Europa. Não poder tomar uma taça de vinho durante a refeição e depois conduzir o seu carro na França, Itália , ou Portugal é impensável. Agora eu pergunto por que a fiscalização não era tão intensa quando o limite era outro? E assim, de gota em gota ou de copo em copo, vamos perdendo a nossa liberdade e escorregamos para um estado policial como a União das Republicas Socialistas da América Latina.

Soube? disse...

Sabe, essas pesquisas muitas vezes são intrigantes.
Se você perguntar hoje, publicamente, sobre a valorização dos gays, só os "radicais homofóbicos" são contra.
Entretanto, curiosamente, vi uma pergunta que me intrigou, numa página da internet, que não me lembro qual, mas era Terra, Uol, Folha, ou algo assim. Uma modelo, dessas de sucesso do momento, no programa da Hebe disse que não gostaria de ter um filho gay.
A pergunta era se os internautas concordavam com ela. De curioso, fui ver o resultado dessa enquete. Cerca de 70% dos votantes concordavam com ela.
O caso acima também serve de exemplo, mesmo se tratando de outro assunto. Ou seja, manifestadamente somos politicamente corretos, mas no íntimo, nosso desejo não corresponde, e não conseguimos fazê-lo valer.
Estamos no caminho sem volta de uma ditadura que solapa os direitos individuais e de opinião. Hoje ditadura do politicamente correto, amanhã, quem sabe?
O melhor exemplo?
Nós!
Nos escondemos atrás de outros nomes para podermos dar nossa opinião, caso contrário, seríamos linchados em praça pública.
Enfim, em alguns aspectos somos parecidos com aqueles que lutavam pela liberdade, anos atrás. Eles também usavam nomes falsos. A diferença é que nós não sequestramos, roubamos bancos, não precisamos transformar nossos rostos ou matarmos alguém.
Um país que nunca foi melhor do que isto que vemos, dificilmente vai ser diferente (Rui Barbosa quem disse algo semelhante)...

Carlos disse...

Opinião é que nem traseiro, cada um tem o seu. Só não vale é ficar repetindo besteiras como se verdade fossem. De onde saiu essa idéia estúpida de que se pode dirigir dopado? Vejo nos blogs e colunistas de jornal esse argumento ser usado para criticar a tal lei seca. Parece que ninguém tem um pingo de curiosidade, decência ou sei lá o quê pra ir lá no Código e ver se isso é verdade mesmo. Tá lá na lei, artigos 269, 277, entre outros, dirigir bêbado ou tendo feito uso de substância entorpecente tem as mesmas sanções. Defender um ponto de vista é um direito, só não vale apelar para a mentira!
Carlos

(N.G.: Quer dizer que o bafômetro está pegando maconha e cocaína também, Carlos? Porque eu espero que você não caia na infantilidade de querer me convencer de que a polícia está fazendo exames de sangue com a mesma sanha com que está a usar o bafômetro nas esquinas. Como você vê, não me falta decência nem me abundam as besteiras. É você que está com dificuldades para interpretar o texto. )

Bira disse...

Mas os lobbys estão a toda e em ano eleitoral sabe como é...

R. M. Plácido disse...

Só discordo de uma coisa: sua opinião pessoal é perfeitamente transferível, por que não?

pentefino disse...

Certo, NG. O brasileiro é tão banana, mas tão banana que não só aceita ser privado de sua liberdade de beber com responsabilidade, mas também aplaude o presidemente que dirige o país.

A propósito: tem teste de bafômetro para o presidente?

O Editor! disse...

NG,

Geralmente concordo com você, mas dessa vez discordo. E por alguns pontos:

Em primeiro lugar, porque o limite é severo, pode até ser considerado absurdo. Mas políticas públicas devem ser feitas para o povo, todo o povo. E do mesmo jeito que uma taça de vinho não me faz mal, tenho amigas que ficam bêbadas com essa quantidade. Então, se a Lei busca impedir que dirijam embriagados, deve buscar o menor limite possível para que alguém assim esteja.

Em segundo lugar, porque apenas um bombom de licor, ou uma taça de 'papaia com cassis', não se atinge o limite. A comida junto com o álcool reduz a velocidade de absorção da bebida, e, portanto, impede que vc fique bêbada. Além disso se a sua tolerância ao álcool for pequena, com certeza o cassis será apenas para deixar um aroma no papaia, e não o suficiente para afogá-lo.

Em terceiro lugar, como bem lembrou Carlos num post abaixo, dirigir sob influência de substância entorpecente (álcool, maconha, cocaína, etc.) é crime. E não, a polícia não vai fazer exames de sangue para determinar se alguém está drogado, pois tal teste, da mesma forma que o bafômetro, não pode ser realizado sem a concordância do acusado (é inconstitucional). Todavia, há testes chamados clínicos, não invasivos, que podem ser feitos para determinar a aptidão da pessoa (aquelas coisas de andar em linha reta, tocar a ponta do nariz, etc.).

Se esses testes não são feitos, utilizo-me da sua argumentação: Então devemos lutar para que sejam efetuados. Devemos lutar para que os que estejam dopados sejam pegos, multados e até presos. Mais: Os direitos individuais da pessoa se embriagar são inalienáveis. E o meu de continuar vivo, são e inteiro também são inalienáveis. Assim, se alguém quer beber, que o faça sem colocar terceiros em risco. Que o faça sem dirigir.

Entendo que é um saco não poder sair para beber tranquilamente com os amigos e voltar pra casa dirigindo. Eu também acho. Aliás, agora teremos que fazer planejamento para ir para Happy Hours com os colegas. Mas levando-se em consideração que, aqui em São Paulo por exemplo, tivemos uma queda de 29% no número de vítimas atendidas em hospitais, acho que a lei serviu a seu propósito.

Afinal, acho que faz mais sentido alguns milhões ficarem aborrecidos (e não é nada a mais do que isso: um aborrecimento) e algumas centenas de famílias continuarem com seus filhos e filhas vivos e/ou ilesos, do que o contrário.

Sei que isso tudo parece clichê, mas a vida muitas vezes é cheio deles.

Beijos,

O Editor!

Jorge Nobre disse...

Esse argumento do Carlos eu também vi no Orkut, Nariz. E eu então repliquei que com certeza alguns bêbados serão pegos pelo bafometro, alguns bêbados terão problemas com a justiça, alguns bêbados terão que dar algum aos guardas, mas eu duvido que isso acontecerá com algum drogado.

A discussão acabou...

Ligia disse...

Oi Nariz!

Fiquei aliviada lendo, estava me achando louca e irresponsável por ser contra essa nova lei, sabia que na novilíngua já existe alcoolatra passivo?
Saudades do tempo do Caetano cantando É Proibido Proibir.Eles estão se aproveitando do clima de insegurança total pra criarem leis drásticas, agora o que interessa mesmo eles não mexem nem proibem. Que cambada senhor!
Como é úm país piada recebi e mail engraçado falando da revolta das feias, deu pra elas ;)

Ary disse...

Mas então que liberem as drogas também,já que se pode andar alcoolizado e armado pelas ruas. É importante lembrar que a lei seca não proibe ninguem de beber.Proibe que as pessoas bebam e dirijam embriagados.É engraçado como algumas pessoas acham que o estado não pode interferir na vida das pessoas quando se trata de alei ficar mais rígida para os que fazem uso da bebida.Mas ao mesmo tempo são extremamente contra a liberação das drogas.Aí,nesse caso a presença do estado se faz indispensável.sou contra a liberação das drogas.sou a fvor da nova lei que já diminuiu em 29% o numero de acidentes es SP.

Peregrino disse...

Caro O Editor,

A melhor maneira de testar uma teoria é verificando se ela adere aos fatos. E os fatos informam que não se deve esperar que alguém flagrado dirigindo após cheirar uma carreira de cocaina ou após fumar unzinho seja, pelo menos, admoestado. Seja porque é bem menos visível alguém que fume maconha ou cheire cocaina aparentar que o fez, seja porque é politicamente correto reprimir a oferta (mas não a demanda), embora haja evidências de que a oferta responde em um-para-um à demanda. Por outro lado, é evidente que está havendo uma redução do número de acidentes de trânsito, como resultado do aumento de fiscalização. Mas é apenas RESULTADO do aumento da fiscalização e não porque a lei seca está em vigor. Sou capaz de apostar que em pouco tempo o número de acidentes de trânsito voltará ao normal, apesar da lei seca. Para isso, basta que os policiais que hoje fiscalizam o seu cumprimento sejam deslocados para outras atividades. Isto é, há uma relação causal entre o aumento do rigor fiscalizatório e a redução do número de acidentes e não entre o endurecimento da lei e a redução do número de acidentes. Porém o rigor fiscalizatório independe da lei em vigor.

Um abraço.

FIXtheMAD disse...

“Mas então que liberem as drogas também, já que se pode andar alcoolizado e armado pelas ruas...”

Se você se preocupar em fazer uma diligente análise do custo da proibição das drogas, sejam elas quais forem, observará que por mais que seja condenável moralmente uma pessoa destruir a si mesma consumindo drogas, é mais condenável ainda que inocentes paguem o preço da proibição. E isso pra considerar o custo ético.

Proibiu algo com um valor econômico, no dia seguinte você terá um mercado negro. Mercados negros são o sonho da bandidagem, é o governo criando uma reserva de mercado pros marginais organizados. Inocentes vão pagar o pato morrendo com bala perdida, o pagador de impostos pagará o pato, a sociedade como um todo pagará o pato por que agora temos bandidos ricos corrompendo a polícia...
As leis, assim como as políticas sociais não podem ser consideradas apenas pelos efeitos benéficos de curto prazo. Têm de ser julgadas pelos seus efeitos em conjunto.
Leis não são ações isoladas que servem para manifestar o gosto moral da maioria. Leis têm efeitos práticos na vida dos indivíduos. As leias alteram a ação humana. Acho de uma irresponsabilidade tremenda que se proponha todo tipo de lei pra mitigar todo tipo de conflito social sem a análise cuidadosa de seus efeitos. Não existe a utopia legalista.

Os conservadores brasileiros poderiam aprender muito com gente como Willian Buckley.

http://www.youtube.com/watch?v=lNw2r-qmopI

Não ouso a chamar Milton Friedman de conservador, pois os amigos da liberdade sabem que Friedman é um campeão libertário, mas também pode ensinar muito à o conservador brasileiro.

http://www.youtube.com/watch?v=37-zCyI6rmk


Um abraço a todos.

O Editor! disse...

Caro FIXtheMAD,

"Já temos uma lei que pune uma pessoa que mata ou fere outra se agiu de forma completamente irresponsável. Não é suficiente? E Por que não é suficiente? O temor em causar um acidente embriagado, e ter de arcar com pesadíssimas conseqüências por esse ato deveria ser suficiente para mitigar comportamentos irresponsáveis."

A argumentação é torta e digo o porque: Você pressupõe, como vários antes de você, que o ser humano é uma criatura racional, boa e justa. Que acatará um comportamento socialmente responsável senão por ser responsável, pelo menos por ter medo da punição. Concordo que isso pode funcionar com a maioria da população, mas não com todos. Assim, pela sua argumentação da repressão moral das leis, o crime de homicídio deveria ser punido, mas não deveria ser punida a tentativa, uma vez que o mero medo da legislação penal contra o homicídio já preveniria a tentativa.

A punição por uma atitude anti-social e irresponsável é necessária não apenas para punir um desvio de comportamento, mas também para manter intacto o Pacto Social. Isso porque o Pacto, conforme Kelsen teorizou, pressupõe que os homens, em prol da vida em sociedade, abdicam de certos direitos para promover a paz social e manter uma estrutura de unificação com seus pares.

Vale lembrar que a liberdade plena de um indivíduo sempre irá colidir com a liberdade plena de outro. Inclusive por isso é que o poder coercitivo e de polícia não se encontra nas mãos dos cidadãos, mas de um grupo escolhido por estes para gerir a comunidade e para legislar (sempre em teoria) para que tal lei seja aplicada no caso concreto. Assim, é necessário reforçar que a abdicação de direitos pessoais é parte integrante e inseparável da vida em sociedade.

Você menciona ainda que "Leis preventivas SEMPRE atropelam os direitos individuais naturais, e a retórica coletivista é SEMPRE usada, mas não é suficiente. Quem defende esse tipo de lei tem o ônus de provar de forma inequívoca que o resultado final será mais positivo, e ainda tem o dever de considerar todo o processo.". Não sei qual o 'direito individual natural' que você vê no caso prático (que protegeria o dopado/ embriagado). Creio que seja o direito de não produzir prova contra si mesmo. Apenas devo lembrar que esse direito, no entanto, colide com o direito de terceiros de permanecerem vivos e ilesos. E quando há a colidência de direitos individuais ou coletivos, sempre deve-se buscar o direito mais importante a ser protegido, ou, não existindo tal valoração, proteger a ambos, diminuindo ambos e encontrando uma saída que não acabe com o direito de uma das partes. Por isso, quando há a colisão entre o direito de locomoção e de não produzir provas contra sí mesmo (do embriagado ou acusado de assim estar) e o direito à vida (do terceiro), este direito deverá ser protegido. Porque? Porque embora o embriagado tenha o direito de não produzir provas contra si mesmo, ele tem direito de produzir provas a seu favor. E se assim proceder ficará livre de qualquer punição, pois seu direito de locomoção estará garantido (uma vez que não gera riscos a terceiros).

Isso quer dizer que o direito de locomoção de um embriagado está restrito? NÃO! Ele pode se locomover, pode ir do ponto A ao ponto B sem nenhum problema. Apenas não pode fazer tal trajeto arriscando a vida de terceiros.

E repito: EM QUALQUER LUGAR EM QUE HAJA UMA SOCIEDADE, HÁ RESTRIÇÕES DE DIREITOS; Isso porque o direito do "O Editor!" termina onde começa o direito do "FIXtheMAD". E é necessário que assim seja.

O Editor! disse...

Peregrino,

Concordo que a fiscalização é que gerou a redução. Concordo que talvez tivéssemos uma redução parecida se apenas a lei anterior fosse fiscalizada.

Então o que discutimos aqui é o montante de álcool a ser permitido no sangue, e não mais se a lei (ou a fiscalização) estão corretas. Então a discussão é se consideramos correto o valor da concentração permitida de álcool no sangue e não se os embriagados devem poder dirigir. Essa discussão é totalmente válida e assumo minha ignorância: Não tenho a menor noção se o índice esteja correto. Quero acreditar que sim, que em algum momento isso foi estudado, mas não tenho como confirmar.

O que também podemos discutir é se o povo age como "vaquinhas de presépio" (como colocado por nossa querida NG) por gostar de ser tratado como um idiota incapaz de cuidar de si mesmo, ou se o povo age assim (apoiando uma lei severa), porque deseja que o Estado assuma suas responsabilidades e imponha leis (rígidas ou não, é indiferente para esse argumento) para regular a vida em sociedade.

Eu sou adepto do Estado mínimo, aquele que cuide das lei, das prisões, da saúde pública e que regule a competição entre particulares. Só. Mas me sinto completamente abandonado como cidadão, pois temos um Estado inchado que muito custa e nada regula, que não faz nada que possa ser remotamente considerado impopular, mas que seria o certo. E regular se os cidadãos podem dirigir sob efeito de álcool e qual o limite permitido para tanto é um dever do Estado.

Fabio Tagliavini Neto disse...

FIXtheMAD escreveu por mim , porém com mais clareza e português muito melhor.



Abraço cordial,


Favbio Tagliavini Neto.

Lefebvre disse...

O blog do Zé está fazendo um bom clipping sobre as leis que combatem motoristas bêbados no mundo.

E eu acho engraçado alguns acharem que dois chopps deixam a maioria da população embriagada. Ai apelam para o sentimentalismo. Esse assunto já está cansando. Vai acontecer a mesma coisa da época do desarmamento. Difícil colocar na cabeça dessas vacas que não são as armas que matam. Mas as pessoas. Amizades acabarão nessas discussões.

Enfim, o brasileiro médio adora ser ferrado. É cultural.

FIXtheMAD disse...

Caro O Editor.

Você tem razão quando nos mostra que não existe liberdade absoluta. Ninguém deseja viver em uma sociedade aonde existe a liberdade para o assassinato, o roubo e a pratica de crimes diversos. Liberdade Absoluta não existe mesmo, ninguém propõe isso. O Ser Humano é imperfeito, e todas as organizações que derivam dos indivíduos também o são. Em muitos casos, organizações humanas ampliam a imperfeição individual.

Acredito que a intenção de coerção somente, sozinha, isolada; poderia ser justificativa suficiente para criar uma lei boa, não apenas a coerção consumada, mas a coerção pretendida e/ou frustrada. Portanto punir a tentativa de homicídio, ou punir o nazista que propõe e incita violência contra indivíduos que partilham uma característica que este acha repugnante, é desejável. É bastante diferente, porém, uma lei que pune uma tentativa de homicídio, e uma lei que pune alguém que tomou uma taça de vinho ou mesmo duas latas de cerveja. Não podemos admitir, a não ser a título de piada, que se comparem um homicida frustrado a alguém que bebe uma taça de vinho e depois dirige seu carro de volta pra casa. São coisas diferentes. A liberdade de beber 2 latinhas de cerveja e dirigir é diferente da liberdade de beber e matar pessoas, não são sinônimos e não existe uma relação de causa e efeito perpétua, nem todos que bebem e dirigem matam no transito, nem todos que matam no transito estão embriagados. Uma grande parcela esta de fato sob efeito embriagante do álcool, mas a maioria dos embriagados bebeu muito mais do que a dose de álcool contida em duas latinhas de cerveja. Portanto, como argumentei em posts anteriores, trata-se de uma lei preventiva, vamos tirar o direito dos que são prudentes e não bebem a ponto de ficarem impedidos de dirigir, e em troca ganharemos menos mortes no trânsito. Essa é premissa, acredito que a premissa não internalizou todos os efeitos que a lei causará na sociedade. É uma lei burra. Quando os holofotes estiverem voltados para outras questões, e quando a lei passar a cobrar seus outros custos como mais corrupção policial, e quando a fiscalização voltar aos níveis pré lei seca, começaremos a ter um entendimento da real eficácia dessa lei. Se no final, a conta do açougueiro continuar a mesma, e a conta da corrupção aumentar. Terei demonstrado pra vocês de forma empírica a necessidade de considerarmos com muito cuidado, leis e políticas sociais.

http://www.ordemlivre.org/node/136

E ainda

Sua noção de pacto social contém a semente do mal, em nome da paz social um monte de monstruosidades podem ser feitas. Poderíamos em nome da paz social, restringir e regulamentar a liberdade de expressão, a liberdade de associação ou mesmo do exercício de religião. John Stuart Mill nos explica como a boa vontade e as boas intenções podem levar a um ambiente onde o estado vira o instrumento de destruição das liberdades individuais. É um erro crasso achar que qualquer lei é boa e que a coerção estatal sempre será bem usada. Sem contar que a história nos conta que o pacto social é um mero construto filosófico, que essa suposta semente geradora de estados não encontra correspondência na história. Mas esse já é outro assunto.

Grande Abraço

O Editor! disse...

FIXtheMAD,

Acho ao mesmo tempo interessante e estranho o seu argumento. "Proibiu algo com um valor econômico, no dia seguinte você terá um mercado negro. Mercados negros são o sonho da bandidagem, é o governo criando uma reserva de mercado pros marginais organizados." Acho complicado discutir nesses termos, pois não divergimos no caminho, mas na origem. Não iniciamos no mesmo ponto e, pelos caminhos que tomamos, nunca iremos nos encontrar.

A base óbvia de qualquer lei é estabelecer o comportamento correto e identificar o incorreto, sugerindo uma punição para este último. É em uma base dessas que um governo deve pautar-se. Identificar o que é saudavel para a sociedade (mesmo que custe parte dos direitos de alguns, desde que em prol dos direitos dos demais), e definir o que é contrário à sociedade, sem precupar-se com a criação de "mercados paralelos" (ou negros) ou com a reação individual de uns poucos que são contrários a tais mudanças que buscam proteger a todos.

Caso os governantes se preocupassem com a criação dessa "reserva legal para a bandidagem", nada seria crime. Pois sempre há quem queira dirigir bêbado, bater na mulher, fazer sexo com uma criança, ou matar alguém. Sempre haverá a possibilidade, com qualquer lei que se crie, dessa "reserva". Então, esse argumento, me desculpe, mas é uma baboseira.

Lei são a representação física dos anseios morais da maioria sim, pois a maioria é o que significa a "sociedade".

Melhor uma lei que proíba algo que afeta negativamente a sociedade, do que a ausência de leis, fato que permitiria que as pessoas façam o que quiserem, sem se preocupar com os demais.

Flavio Dessandre disse...

Até que ponto permitimos que nos tirem liberdades individuais? Vivemos em sociedade, sim, e por isso mesmo abrimos mão de diversas coisas para continuar vivendo nessa sociedade. Essa disussão não vai a lugar nenhum. Por que não proibem todos de dirigirem de noite e de madrugada? Com certeza os acidentes diminuiriam muito, até porque, o sono é um dos principais fatores nos acidentes. Até onde isso vai? Por que tenho que usar o cinto de segurança? Esqueça. Essa discussão é tão inútil, quanto sem lógica.

Os brasileiros aprovam? Que ótimo. Se fizerem outra pesquisa quanto essa lei for derubada, é possível que o resultado seja inverso, e a maioria aprove a derrubada da lei para poder voltar a beber sua cerveja e voltar pra casa dirigindo. Também não há lógica na opinião das pessoas, pelo menos em grande parte delas.

Sharp Random disse...

O país tem um anormal no topo da república dando mau exemplo. A educação pública no Brasil é anormal. A população se pauta na verdade relativa de cada um das novelas e nessa babel moral temos um ambiente anormal.
Nessa altura vc. já deve estar se perguntando... mas o que é normal ?!?
É mais ou menos assim: eu sou uma ilha e exijo que a coletividade dos meus sonhos se adapte aos meus desejos. Assim seremos todos normais.

Ora, vivemos fragorosa anormalidade a exigir de nós uma cota maior de abstenção em nome de um despertar em massa para aquilo que realmente tem valor e está sendo abandonado paulatinamente em nome de liberdades individuais absolutamente desacompanhadas da correspondente responsabilidade pois dia após dia diminue o número daqueles que ainda ligam uma coisa a outra.

(N.G.: na verdade, Sharp, eu fiquei me perguntando é se você gostou ou não da lei. Sem rebolar: sim ou não? )

FIXtheMAD disse...

Caro O Editor

A diferença como observamos essa questão pode ser resumida da seguinte forma: Você acha que uma vez capturada a descrição de um ambiente social em conflito. I.E. Muitas mortes no trânsito acontecem pelo fato de que 50% dos indivíduos envolvidos estavam embriagados pelo álcool. É suficiente uma consideração ética exclusivamente apriorística. Perdemos a liberdade para beber poucas quantidades de álcool e dirigir, ganhamos menos mortes no transito. Parece uma boa troca. Só que a análise do impacto da lei não foi aprofundada. Eu acredito que devemos colocar nessa conta, não apenas as considerações éticas do ambiente social em conflito sem a lei, mas os custos éticos que emergirão do ambiente com a lei aplicada. Não importa que a lei não intenciona, que a lei não busca criar corrupção policial (pra falar só de um desses custos). O que importa, é que estamos usando essa lei para modificar a sociedade; trata-se de um instrumento pragmático, aplicado. Queremos que a lei salve vidas, queremos modificar o ambiente social. Se no final das contas, terminamos pior do que começamos. A Lei é ruim. Mesmo que os custos, que os efeitos ruins dessa lei não façam parte da intenção dos legisladores.

Ex: Consideremos a liberdade do cidadão brasileiro de por exemplo, possuir um carro, gozar das benesses que esse aparelho traz pra vida das pessoas e trará para a sua vida. É uma liberdade positiva, uma questão de acesso. O Acesso a um automóvel é direito de todos os cidadãos. É algo eticamente incontroverso, tirando as pessoas incapacitadas em dirigir um carro por questões de capacidade. Muito bem, supondo que então façamos uma política pública de acesso a automóveis para os pobres. Você seria a favor de uma lei assim? A lei simplesmente da ao estado a responsabilidade de promover o acesso dos pobres aos automóveis. A Constituição Federal Brasileira esta recheadas de leis desse tipo. Onde esta o Catch 22?

Como vivemos em uma realidade de escassez, finita em tempo e em recursos, se faz necessário considerar o impacto que as regras causam na forma como agimos após a aplicação dessas regras.

Pessoalmente, dou um peso muito grande para as liberdades individuais, para as liberdades negativas. Acho a liberdade individual um valor muito, mas muito importante. Por isso, na minha conta, quando a liberdade individual é sacrificada em nome de um bem maior, eu desconfio. Só que todos possuímos valores éticos. Nem todos têm o amor que eu tenho pela liberdade.

Mesmo assim, mesmo pelo metro ético de um não liberal, é importantíssimo considerarmos os custos morais, éticos de uma lei, após sua aplicação. Se você crê que o valor mais importante é a igualdade, e então observa que após a aplicação de alguma lei, a desigualdade aumentar, mesmo não sendo a intenção de seus proponentes, certamente iria reconsiderar a questão. A estátua da justiça segura uma balança ( e é cega, logo a “justiça social” da ação afirmativa é racismo.. hehehe... sorry) portanto pesemos todos os custos.

A última palavra nesse debate é sua, não me resta muito mais a dizer.

Paz
Um Grande Abraço

Zinha disse...

Olá, NG,boa tarde!
Bem pensado...estão nos tirando um mínimo de liberdade e ainda tem gente que nãp percebe e bate palmas...
Só queria saber uma coisa: por que não fiscalizavam com o mesmo rigor,na lei anterior?
Por que esse "terrorismo" com quem apenas quer jantar numa gostosa cantina,e tomar uma deliciosa taça de vinho... me sinto uma prisioneira só de pensar nisto!
Gde abç,
Zinha

O Editor! disse...

Caro FIXtheMAD,

Não considero que a lei é ruim, apenas a sua aplicação. Os parâmetros estão corretos, mas o sistema continua dando erro por diversas questões.

Mas entendo (e até concordo parcialmente) com sua posição.

Infelizmente, neste país, a última palavra não é nem a minha, nem a sua, nem a de nenhum outro cidadão "comum".

PAZ para você também.
Para todos nós, na verdade.
Um abraço,

O Editor!

Sharp Random disse...

Respondendo. A lei é ótima. Num país em que a cultura medíocre impõe representantes medíocres eleitos para elaborarem leis "para pegar ou não pegar", por hora, não tem outra maneira de coibir os hábitos nefastos. Mais adiante quando a educação do povo, oferecida pelo Estado, voltar-se para os interesses nacionais, talvez possamos liberar geral. A experiência mostra que hábitos saudáveis impostos por lei dificilmente retroagem em razão mesmo dos benefícios que trazem ao conjunto dos cidadãos.
A lei é boa. A filosofia do bem estar comum, a despeito de leituras egoísticas, está presente e claramente assimilável pelo povão. Se vai dirigir não beba e ponto.
Nós, como nação, somos a média. Se desejamos uma média mais alta, temos que abolir a conceituação de castas. Se nós que opinamos e nos fazemos ouvir não procedermos assim virão outros "Lulas" ganhar as massas e nos impor seus remédios.
Até o momento, somos vítimas de nós mesmos.

jonh doe disse...

NG

esta lei absurda só poderia sair no governo de um bêbado que só anda com motorista ou piloto...

bastava tolerância zero nas estradas e os 0,6g na cidade. somados à fiscalização rígida, seria suficiente para ter os mesmos níveis de redução de acidentes, se é que eles ocorreram.

não haver um mínimo de tolerância é o fim da picada!!!


vc pode cheirar uma montanha de cocaína, mas não ataque uma caixa de bombons com licor se for dirigir!!!

Fábio Peres disse...

O que essa Lei mostrou é muito simples:

- entre beber e dirigir, o cidadão prefere dirigir porque o status de um bêbado é insignificante e o de ter um carro é o máximo na "terra brasilis";
- dos 86% dos cidadãos que aprovaram a lei, a grande maioria vai do trabalho pra casa e de casa pro trabalho, sem passar em baladas ou eventos que envolvam bebida e diversão;
- desses 86% a grande maioria até agradecem a Deus pelo filho parar de beber com as más companhias por causa da tal Lei.

Concluindo: a Lei Seca nos permite dizer que brasileiro só é solidário no câncer e que somos, no fundo, um bando de caretas que ainda acredita que bons, mesmo, eram os tempos dos nossos avós (onde, aliás, nem tinha carro pra todo mundo e o bonde reinava na cidade).

Ou não?

bebeto_maya disse...

A redução mágica do número de acidentes foi maquiada pela fiscalização intensa. Foi a fiscalização, não a redução nos limites de consumo, que reduziu a incidência de tragédias.

Uma pesquisa imparcial teria de comparar o antes, sem fiscalização, com o depois, sem fiscalização, também (ou ambos, com.). Porque aí, teriamos a margem exata do suposto benefício da lei seca.