Era de se esperar que os nossos ilibados parlamentares agarrassem, com unhas e dentes, qualquer oportunidade para tentar acabar com o anonimato na blogosfera política.
Impressiona é o número de jornalistas e articulistas comemorando o fato - ainda que alguns, como Fernando Rodrigues, em artigo de hoje para a Folha de S. Paulo, dêem tratos ao porongo para apontar a inviabiliade da coisa.
Daí que eu, quase sete anos de blog, fico aqui pensando de onde vem este problema dos jornalistas com o anonimato na blogosfera. Porque o problema - embora agora, por força das circunstâncias, esteja em evidência - não é novo.
Só para refrescar a memória: em novembro de 2005, Ricardo Noblat me convidou para ser articulista em seu blog - à época, hospedado no Estadão. Duas semanas depois, o jornalista Luiz Cláudio Cunha fez um artigo para o mesmo blog reclamando do meu anonimato. Noblat, então, deu razão à Cunha: ou eu me identificava, ou estava desconvidada. Desconvidei-me - com alguma seriedade lá e uma piada cá.
O episódio é emblemático do que agora, ao embalo de "reforma eleitoral", se volta a discutir. Porque me parece que boa parte da questão "jornalistas x anonimato na web" se explica pela sabedoria popular: eles, a grande maioria dos jornalistas e articulistas da política nacional, pegaram o trem com atraso e estão, até hoje, tentando descobrir qual é o destino.
A blogosfera política nasceu longe das redações dos grandes jornais. Foi só muito depois, quando os blogs tocados por anônimos já bombavam, que os jornalistas da área começaram a apostar na ferramenta. No Brasil não foi diferente. Quando Ricardo Noblat inaugurou seu blog, em 2004, a blogosfera política nacional já era uma realidade. Este blog, por exemplo, já existia. Assim como existiam o Lassaiz Fair, o Contra-Ilusão, O Indivíduo e todos os Wunderblogs - muitos deles discutindo política. A maioria optava pelo uso de pseudônimos. Verdade seja dita: muitos blogueiros eram jornalistas das mais diversas áreas que mantinham blogs sobre música, literatura cinema e política pelo simples prazer de escrever sem as amarras e o formalismo das redações.
Desempregado, Ricardo Noblat entrou, ele mesmo conta, intuitivamente nesta onda. E foi assim, intuitivamente, descobrindo aos poucos as particularidades do ambiente em que se metera, que construiu o primeiro grande blog de política assinado por um jornalista de renome do país. Até o episódio envolvendo a minha participação como articulista, Noblat jamais brigou com o anonimato. Defendeu o direito ao pseudônimo - e ainda o defende ao acolher, diariamente, comentaristas identificados tão somente por um apelido. Mas é inegável que sucumbiu à patrulha daqueles que, como Luiz Cláudio Cunha, chegaram depois e se sentiram incomodados com a realidade posta.
Uma revolução
Parece que a tal da "realidade posta" era nova demais e, porque incontrolável, perigosa demais. Quem era aquela gente anônima que escrevia, investigava, opinava, publicava, e ainda por cima, era lida?! Quem era aquela gente, que escrevia sem responder a patrão, editor ou patrocinador? Quem era aquela gente livre de amarras, que não queria fama ou grana, mas queria somente opinar?
Que me desculpe a classe mas é este ressentimento, fruto de uma descoberta tardia, de ter que correr muito para alcançar um fenômento, e da frustração de conviver em um ambiente onde as velhas regras das redações não podem ser aplicadas, que percebo em alguns artigos e comentários. Artigos como os de Clóvis Rossi, de Fernando Rodrigues e Reinaldo Azevedo que, a despeito do indiscutível sucesso alcançado na web - prova de que chegar mais tarde não condena o vivente ao fracasso - jamais escondeu seu incômodo com o uso de pseudônimos.
Há, também, aqueles que se mostram ressentidos com o anonimato na web porque, justificam eles, são diariamente achincalhados, ofendidos, agredidos verbalmente, por pseudônimos - contra os quais, alegam, "nada pode ser feito". Mais uma vez: a turma chegou tarde e tem dificuldades para entender o ambiente.
Blog, meus caros - e principalmente blog de política - não é coisa para quem tem pele fina. É preciso ter pele grossa. Pele grossa para ser achincalhado em praça pública. Ou pele grossa para fazer moderação, não deixar que caluniem você ou terceiros, e agüentar a fama de ditador. Podem escolher. É uma coisa ou outra.
Agora, se você não quer apanhar em praça pública, não quer correr o risco de ser processado por calúnias a terceiros, mas também não quer - por princípios ou dificuldades operacionais - moderar comentários, melhor saltar deste trem e voltar para o conforto e a segurança das redações. Lá, no século XX, onde nada se publica sem RG e CPF, é o seu lugar.
Não se preocupem, ninguém vai reparar. E depois, é melhor fazer isso do que se aliar aos piores tipos que a política nacional já elegeu para tentar, luta inglória, parar este trem.