domingo, 17 de fevereiro de 2013

Marina, Yoani e o vitimismo como estratégia de marketing político


Não é de hoje que o vitimismo tem se mostrado uma poderosa estratégia para a “conquista de mentes e corações”. A trajetória de Gandhi está aí para comprovar que a força deste recurso discursivo antecede o marketing político como hoje o conhecemos. É uma força que reside, antes de tudo, na universalidade da sua linguagem: todos somos capazes de reconhecer e simpatizar com a fragilidade e vulnerabilidade humanas.

Não vou, aqui, me demorar sobre questões óbvias como a construção de um discurso maniqueísta – do forte opressor contra o fraco oprimido -, invariavelmente emitido em volumes que dispensam a agressividade e abundam em melancólica condenação a sugerir mudanças.  Também penso que são desnecessárias observações sobre o importante papel desempenhado pela linguagem não verbal – de uma imagética que, idealmente, inclui fragilidade física, gestual contido e assexuado, bem como o uso de panos, mantos e outros trapos a cobrir o corpo.

Prefiro falar do quanto, durante seu período embrionário, tal construção parece passar despercebida por gente com tino para as coisas da política. Na maioria das vezes, os beneficiários da estratégia vitimista só passam a ser encarados como tal depois que já ganharam peso político suficiente para influenciar as urnas.

Confesso que me coloco fora deste distraído clube por uma questão simplória e jocosa; um traço de personalidade: na vida ou na política, detesto vitimismo. Sou do tipo que quando a amiga vem se lamuriar do marido pela terceira vez já começo a ficar grosseira, sugerindo o divórcio. Logo, é a impertinência que faz soar o meu radar interno sempre que vejo germinar uma liderança política com base em um discurso vitimista.

Daí que, muito cedo, coloquei Marina Silva em meu radar. Ela nem era senadora e eu já sentia eriçar os pelos da nuca ao perceber, em sua trajetória, os sinais clássicos de uma estratégia vitimista: o histórico de dificuldades, a fragilidade física sempre evidenciada, a voz sôfrega a suavizar o peso de um discurso de conteúdo radical e, é claro, os panos.  Riam da força imagética dos “panos” sobre o inconsciente ocidental todos aqueles que nunca se dedicaram ao estudo da arte sacra.

Mas falar sobre e Gandhi e Marina Silva está fácil demais por estes dias. Difícil é identificar em Osama Bin Laden as mesmas táticas, direcionadas – fique bem claro – a objetivos totalmente diversos.  Difícil é olhar para Yoani Sanchez, perceber que a estratégia já vem em bom curso e arriscar-se a perguntar até que ponto é consciente ou resultado de uma intuição poderosa. 

Não, não penso que Yoani Sanchez é, como querem alguns adeptos das teorias conspiratórias, agente do regime cubano. Também não duvido que, como afirma a última edição da revista Veja, exista uma operação para espioná-la em sua visita ao Brasil.

Para ser bem franca, nenhuma das duas coisas me interessam.  Yoani Sanchez só me interessa porque percebo em sua conduta elementos inconfundíveis do vitimismo enquanto estratégia de marketing político. Seu discurso, que ultrapassou as fronteiras da internet para ganhar a admiração mundial, é um lamurio triste a apontar problemas e injustiças às quais parece não ter forças – espirituais ou físicas - para resistir. Seus posts e tweets são permeados de sinais de que descartaria qualquer atitude mais enérgica contra um regime reconhecidamente perverso e violento. 

Por pior que seja a situação relatada, não há um só pingo de revolta estridente, de bílis, no discurso de Yoani. E o fato óbvio é que ela não seria laureada ou reconhecida internacionalmente se mostrasse o fígado. O palatável, por esses dias, fala manso; comove antes de seduzir; conquista pela fragilidade aparente.

É verdade que ainda não vi – embora não tenha procurado – Yoani Sanchez envolta em panos. Mas também é fato que os longos cabelos, por ora, lhe caem nos ombros produzindo efeito similar. É preciso, ainda, reforçar o questionamento feito anteriormente: impossível saber até que ponto o que está em construção é fruto de um processo intuitivo ou de uma estratégia primorosa.  Mas é obrigatório aceitar que, como filóloga, a cubana não ignora por completo as artes do discurso.

Admito que é com curiosidade quase científica, e um tanto de divertimento, que venho acompanhando a trajetória de Yoani Sanchez. É certo que a blogueira ingressará na vida política tão logo a oportunidade se apresente. E vai surpreender. Principalmente aos que hoje lhe dão projeção a fim de atingir governos de esquerda. Na melhor das hipóteses, arrisco que estão ajudando a criar outra Marina Silva.